segunda-feira, 12 de julho de 2010

Intérprete

Eu gosto de falar de música. Eu já até tentei ser músico, sabia? Não deu certo e acho que não poderia mesmo dar. Levei a sério demais a coisa. Estudava música, mas nem sempre a sentia. Tive algumas bandas, toquei teclado, banquei o compositor, o sentimental. Não era pra dar certo. Acho que não fazia pela música, fazia por mim. Talvez fosse uma mistura de diversão adolescente com coisa de ego, sei lá. Troquei o palco pela sala de aula. Acho que era o que devia ter feito mesmo.

Assistindo ao programa Zoombido, aquele do Paulinho Moska no Canal Brasil, ouvi a Maria Gadú definindo música como “simbiose dos sentidos”. Achei aquilo tão legal. Lembrei de uma amiga que “sofre” de sinestesia. Sente o cheiro, a imagem e até a textura da música. Coisa louca. Minha nova diversão é escolher uma música no som do carro e perguntar a ela o que sente. Ouvi coisas incríveis. Consegui até entender melhor algumas músicas que pra mim tinham um sentido um pouco esparso. Ela sempre me oferece uma visão diferente de uma música que eu gosto. Cutuca minha imaginação. Se eu tivesse esses sentidos tão aflorados talvez tivesse conseguido ser músico de verdade. Ou pelo menos compreendido melhor aquilo que tentava fazer, sei lá.

Música é interpretação? Claro que é. Mas o que não é interpretação, pô? Interpretamos música, interpretamos as nossas relações pessoais, interpretamos a vida. Existe até uma teoria sociológica que aponta o indivíduo como intérprete de seu papel social. Coisa da sociologia norte-americana, não gosto muito, mas faz um sentido danado. Interpretar é fornecer significado, e isso cada um faz de um jeito. Eu interpreto uma música, um olhar, uma frase da maneira como eu quiser. Não existe uma verdade. Somos intérpretes da vida, ou não somos? A gente interpreta a vida, mas também interpreta para a vida. Modéstia a parte, tenho feito o segundo com exímia competência.

Droga. Jurei que esse texto ia falar de música. Acho que a música foi o pretexto pra falar de mim. Assim é mais fácil, não preciso falar com todas as letras o que penso de mim mesmo. Eu gosto mesmo é de deixar tudo aberto, livre para os intérpretes que gastaram seu tempo lendo. Ficamos assim. Interprete isso como quiser.


3 comentários:

  1. uma pessoa de muitas letras e poucas palavras deve ser interpretada pelos olhares, os olhos tem a mesma função que a música, os olhos passam o cheiro da pessoa, qual gosto tem o modo como se relaciona, os olhares tem textura, tem forma... neste momento seu texto se coloca como seus olhos e como as suas músicas, únicos, com cheiro de caramelo e café, com nuances de fim de tarde, sabe, aquele verde que aparece entre os morros, o tom mais baixo durante o por-do-sol, essas são as cores desses pensamentos leves e cheios de confissões que diariamente encontro em seus olhos e em seus textos...

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  2. Adoro ler os seus textos.
    Algumas frases faz eu voltar no passado não muito distante e lembrar com carinho.
    Te Amo

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