segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Aquela pressinha

Eu acho graça quando estou indo embora e ela faz uma carinha triste, como quem pede pra que eu fique. Dá uma coisinha boa, sabe? Dá uma vontadezinha de ficar. Dá vontade de fingir que vou embora só pra ver aquela carinha. Às vezes se tem que ir mesmo, às vezes se vai e se arrepende. Como hoje. Como tantas noites. Nas noites em que se dorme sozinho tudo é pior. Se estiver frio, meu quarto vira o Alaska. Se estiver calor, ele vira o Saara. Não é possível dormir, não é possível pensar no trabalho, não é possível achar nada na internet e muito menos na TV. Não é possível não pensar nela.

Meu pai me disse: “É estranho esse negócio de vocês não conseguirem dar um passo separados”. Não é não, pai. Pra mim, estranho é conseguir. E eu tenho essa certeza nas noites em que me deito neste quarto. O olho no ventilador de teto, as mãos vazias. Sensação de vazio. É sozinho que pensamos nas coisas mais incríveis. É sozinho também que pensamos nas mais idiotas. E aí, numa noite quente e solitária, chego à conclusão de que sou completo. Como o vazio pode provar que sou completo? Isso é incrível ou idiota? Incrivelmente idiota.

Por isso, quando é hora de ir embora eu sempre fico um pouco mais. Ou fico até a manhã seguinte. Aquela carinha que me faz graça me mantém por perto. Gosto de dormir olhando pra ela, decorando seu rosto. Um amigo, não me lembro quem, mas algum amigo mais inteligente que eu, me disse uma vez que o amor está nas pequenas coisas. Ele tem razão. O amor não está nas grandes emoções, nos grandes acontecimentos. O amor está na rotina. O telefone que toca às quinze pras sete da manhã, pra dar bom dia. O almoço improvisado em uma pastelaria. Um beijo rápido antes de ir pra próxima escola. Até na briga está o amor. Aquela frase mal interpretada. Aquele ciúme que dá dor de barriga. Aquela preguiça de sair de casa, de acordar cedo. O amor está na falta de dinheiro, no sofá e na televisão. Está no caminho de casa, no beijo no ombro. Está na mão que segura firme, no olhar sereno. É aquela vontade de não trabalhar. Aquela coisa de não se importar com coisas sérias. Aquele strogonoff, aquele brigadeiro, aquele lanche da rua de trás. O amor é aquela pressinha.

Aquela pressa de viver ainda mais o que já se vive.



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Um texto antigo. Estou me esforçando pra voltar a escrever.

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